Por Caetano Barata
Olha, essa fala do ministro Noronha não é só uma piada de mau gosto – é um reflexo de algo muito maior. A ideia de que “a maldade está mais em quem ouve do que em quem fala” é a clássica tentativa de inverter o jogo, como se o problema fosse a reação das pessoas, e não o preconceito embutido na fala. Mas não dá pra fingir que a história começou agora. Tem séculos que o povo negro, e especialmente os baianos, ouvem esse tipo de coisa disfarçada de brincadeira. Sempre aquela velha narrativa: baiano é devagar, baiano é preguiçoso, baiano não tem agilidade.
Isso não é só um comentário aleatório – é um dos pilares do racismo estrutural, esse mesmo que insiste em reduzir pessoas negras a estereótipos que desqualificam, infantilizam e limitam. O pior é que esses estereótipos não ficam só na conversa de bar ou na “brincadeira” de um ministro. Eles impactam diretamente as oportunidades, a forma como a sociedade enxerga a população negra e até as decisões que são tomadas lá em cima, onde esse mesmo ministro exerce poder.
E quando o governador Jerônimo – um homem negro, baiano, que sente na pele o peso desse tipo de discurso – responde, o que acontece? Noronha diz que ficou “triste” com a nota. Como se o problema fosse quem reage e não quem fala. É sempre assim: quem aponta o racismo é tratado como exagerado, mas quem reproduz o preconceito se coloca no papel de vítima da “era do mimimi”. A gente já viu esse filme antes.
O problema não é só o que foi dito, mas o que essa fala revela sobre quem tem poder no Brasil. Se até um ministro do STJ, um cara que deveria zelar pela justiça, reforça esse tipo de visão, imagina o que não acontece em outros espaços, onde as decisões afetam diretamente a vida das pessoas? A Bahia – e todo o povo negro – não pode ser reduzida a piadas de gente que nunca precisou lutar pra ser levado a sério.